POR QUE AS CAIXAS BRILLO DE WARHOL SÃO ARTE ENQUANTO AQUELAS COM AS ESPONJAS NOS SUPERMERCADOS SÃO APENAS EMBALAGENS?

Essencialmente, é preciso haver razões para que algo seja arte.¹ (Arthur C. Danto)

michele medina
2 min readSep 6, 2020
Brillo Soap Pads Boxes na retrospectiva de Warhol no Moderna Museet, Estocolmo, 1968.

Que arte poderia surgir em uma sociedade de consumo, onde as imagens definem a realidade da nossa existência? A pop art, de quem Andy Warhol é o grande nome, foi o movimento artístico que não buscava analisar o contexto cultural, mas se mesclar a ele. E para se mesclar, buscava na publicidade a sua inspiração. De lá saem os seus duplos, seus simulacros de realidade.

Ninguém melhor que a pop art entendeu que o objeto em si já não era importante, mas sim a sua imagem. Mais ainda, o desejo que aquela imagem despertava. E ninguém mais que Andy Warhol entendeu que o que estava nas prateleiras dos supermercados, no cotidiano daquela nova sociedade baseada no consumo-desejo [ou desejo-consumo] era o que tinha de mais real e de maior ligação entre a arte e a vida.

Óbvio, que para as caixas Brillo terem um espaço naquilo que Danto chama de “mundo da arte”², que envolve todo o contexto que permite que ela exista como obra de arte, o borrão feito pelos readymades de Duchamp são essenciais. Mas as caixas Brillo parecem ir além de apenas um objeto cotidiano fora do seu lugar-comum. Seria a sua lógica fabril de produção? Em uma História da Arte onde a ruptura com o objeto estava feita e “qualquer coisa” poderia ser arte… já não bastava que “tudo” fosse arte. Era necessário explorar a arte em todas as suas possibilidades.

O icônico Andy Warhol com sua provocadora caixa Brillo.

Os limites borrados entre o que é real e o que é obra de arte já não são mais propriedades que possam ser analisadas, seja através do sensível ou do formalismo. A caixa Brillo se torna arte por estar amparada pelo “mundo da arte”. Não é apenas a banal caixa de supermercado não por seu processo de criação ou por sua diferença material, mas por ter um significado e por ser a “corporificação” desse significado. Ela transfigura a banalidade do objeto. Rompe mais bruscamente com todo entendimento de arte que se tinha, fazendo com que se busque novas percepções para quem procura entender/pensar a arte. Para quem “produz” arte, traz a liberdade de um campo de possibilidades e experimentações com o clichê da vida e da imagem.

¹ DANTO, Arthur C. Andy Warhol. São Paulo: Cosac Naify, 2012

² ______________. Após o fim da arte: a arte contemporânea e os limites da história. São Paulo: Odysseus Editora, 2006.

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Written by michele medina

não escrevo para viver, nem vivo de escrever. escrevo para pensar.

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